Marcelo Guido

A decisão liminar foi tomada no dia 4 de fevereiro pelo juiz Anderson Santos da Silva, da 2ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal. A decisão, em tutela provisória de urgência, determinou que a União Federal pague uma pensão mensal vitalícia de R$ 34,5 mil a Clarice Herzog, viúva de Vladimir Herzog, jornalista assassinado durante a ditadura militar.
Tal decisão faz parte de um processo de busca pelo reconhecimento da condição de anistiado político post-mortem de Herzog. A decisão se baseia na Constituição de 1988, que concedeu anistia política àqueles atingidos por atos de exceção. A Lei nº 10.559, de 2002, regulamentou o Regime do Anistiado Político, garantindo o direito à reparação econômica.
Para o professor e cientista político Marco Antônio Pelaes Costa, trata-se de uma decisão histórica, que gera reflexões sociais no Brasil.
“Trata-se de uma decisão histórica, importante, que deve ser comemorada, mas também deve gerar reflexão. A viúva Clarice Herzog já tem 83 anos, está em estágio avançado de Alzheimer, e só agora recebe do Estado brasileiro esse reconhecimento através dessa decisão da Justiça Federal de pagar uma pensão vitalícia, que é mais simbólica do que qualquer outra coisa agora. Mas ainda assim, apesar dessa reflexão, é importante, porque nós vivemos um momento no Brasil onde há muitos setores, inclusive com bastante apelo popular, que dizem, ou que falam que não houve uma ditadura no país, ou que dizem que a ditadura foi boa. E o Vladimir foi executado pelo Estado brasileiro, pela ditadura civil, empresarial e militar que governou o Brasil por 21 anos.”
Em sua decisão, o magistrado citou a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que obriga o Estado brasileiro a cumprir as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A Corte já condenou o Brasil pela falta de investigação e punição dos responsáveis pela tortura e morte do jornalista.
O radialista da Rádio Difusora de Macapá, Paulo Silva, decano do jornalismo amapaense, concorda com a decisão da Justiça, mas acredita que o Estado brasileiro vai recorrer, além de defender que essas decisões devem ser estendidas a todas as viúvas e famílias de pessoas que perderam entes queridos durante a ditadura.
“Eu considero que essa decisão da Justiça, que ainda é de primeiro grau, cabe recurso, e com certeza a União vai recorrer, mas é um reconhecimento de que o Vladimir Zog foi morto dentro dos porões da ditadura, como foi o caso que gerou o filme Ainda Estou Aqui. E eu compreendo que deveriam ser indenizadas todas as viúvas de pessoas que foram mortas pelo Estado durante a ditadura militar. A Clarice, viúva do Zog, tem hoje mais de 30 anos, sofre de Alzheimer, já no estágio mais avançado, e eu concordo que se indenize não só a Clarice, mas todas as viúvas que perderam seus maridos nos porões da ditadura. Mas, infelizmente, é uma decisão de primeiro grau e, com certeza, a União vai recorrer.”
A decisão também assegurou à Clarice o direito a uma reparação econômica, que deverá ser paga pelo Ministério do Planejamento em até 60 dias após a publicação da portaria que reconhece a condição. O valor da decisão corresponde ao cargo efetivo que Vladimir Herzog ocupava, que era o de diretor do departamento de jornalismo da TV Cultura.
Vladimir Herzog foi preso e torturado nas dependências do Departamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) e, no dia 25 de outubro do mesmo ano, foi morto. A versão dada pelo Exército à época foi a de que o jornalista teria se enforcado com o próprio cinto, mas, em 2013, a Justiça de São Paulo determinou a entrega de um novo atestado de óbito à família Herzog, substituindo “asfixia mecânica por enforcamento” por “lesões e maus-tratos sofridos durante o interrogatório em dependência do 2º Exército” como causa da morte.
Marcelo Guido, Jornalismo Difusora
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